Provavelmente você já ouviu falar no caso Kampusch ou no caso Cleveland, ambos já adaptados para o cinema, e por último, e talvez o mais impressionante, o caso do “monstro de Amstetten”. Todas histórias verídicas sobre sequestros.
Dirigido por Lenny Abrahamson, O Quarto de Jack é a adaptação de Room, escrito por Emma Donoghue. Uma história que também irá abordar o tema, mas que acima de tudo, abordará a relação de mãe e filho. Porém, antes da resenha, é importante dizer que o livro/filme não é baseado em fatos, mesmo que lembre, é uma ficção, mas que com certeza beira o realismo.
Joy (Brie Larson) foi sequestrada quando tinha 17 anos de idade. Ela é mantida em cativeiro com seu filho Jack (Jacob Tremblay), fruto de seus abusos, em um quarto de 7m². Apesar de presenciarmos a força que Joy tem para transformar o pequeno mundo de Jack no melhor que ele precisa, será através dos olhos de Jack que conheceremos esta história. O único contato que mãe e filho têm com o mundo “lá fora” é através de uma claraboia no teto do seu quarto e as visitas periódicas do Velho Nick (Sean Bridgers), o raptor de Joy.
É dentro de seu desespero que Joy bola um plano doloroso para salvar a vida de seu filho, e se possível a dela. Ela compreende que Jack cresce a cada dia, e que logo ele irá entender a triste realidade que os dois vivem. É com a ajuda de Jack que ela bola um plano para enganar o Velho Nick e fugir, finalmente, de seus dias de prisão.
Assim como o pequeno Quarto, a história é sufocante, mas que mostra uma história de superação, força e coragem. Mesmo nos momentos mais complicados, aqueles momentos em que Jack presencia sua mãe lutando contra seus demônios. É assim que a narrativa de Jack vai se desenvolver, com toda sua inocência, o modo que ele enxerga tais acontecimentos, como ele os entende e como ele os supera.
É realmente genial, e extremamente corajoso o que a autora de Room fez nesta história. Como se não bastasse cria-la, ela a cria aos olhos de uma criança, que não sabe nada sobre o mundo, mas que mesmo assim o entende, sem ao menos ter saído do seu quarto, sem ao menos saber da existência de outras pessoas. Acredito que a grande cereja do bolo, seja justamente, a maneira que a história é contata, é a narração de Jack diante as transformações do mundo.
Mesmo sabendo que eles conseguem escapar (isso não é spoiler), é angustiante todos os momentos que antecedem isso durante o filme. Engana-se quem acha que o pior já tinha passado. O grande desafio para esta mãe e este filho é justamente o que vai se desenvolver depois da fuga, a maneira que ambos lidarão com a liberdade, ela que precisa se readaptar depois de anos de abuso e Jack, que deve conhecer, literalmente, tudo.
Assim como tudo é novo para Jack, também existem mudanças para Joy, que ficou 7 anos encarcerada. É triste e agoniante ver o quanto ela lutou para manter seu filho seguro, e agora que o tem, Joy começa a ruir pouco a pouco. O dano que o sequestro causou a família também é muito bem explorada no filme, então como um todo, conseguimos sentir todos os efeitos colaterais desta tragédia.
Achei bem relevante, a autora, que vejam só, também é roteirista do filme (não haveria roteirista melhor para tal tarefa), abordar a influencia da imprensa neste tipo de evento, que ao mesmo tempo pode trazer apoio, mas também uma pressão desastrosa. Imprensa sendo impressa, com perguntas inconvenientes e uma curiosidade sem noção do emocional das vítimas.
A atuação de Brie é tão tocante, tão intensa. Ela me convenceu em todas as cenas. Parecia que era dela toda a força e as fraquezas de Joy e ela passou tudo isso, com uma honestidade sem igual. Se antes o nome de Brie Larson era um nome desconhecido para mim, se antes eu não tinha uma atriz favorita para levar o Oscar, com certeza, depois de assistir O Quarto de Jack isso mudou. É uma atuação digna e merecedora.
É claro que eu não poderia deixar de destacar o pequeno Jacob Tremblay e desempenhou seu papel tão bem, de uma forma tão verdadeira e nossa.. ele é incrível, é uma revelação, uma estrela que ainda tem muito o que brilhar. Joan Ellen, interpreta o papel de mãe e avó, de forma igualmente íntima. Podemos analisar dois comportamentos de mães nesse filme, com pontos de vistas diferentes.
Um ponto positivo para o longa foi também a escolha de manterem apenas um foco na história, que é justamente, a relação de Jack com sua mãe e o amor incondicional. O destino do raptor, e outros “pequenos” detalhes durante a história são deixados de lado, e depois que entendemos isso, percebemos que são totalmente irrelevantes para a mensagem que o filme quer passar o telespectador.
O filme é visceral, você sente na pele, todas as angustias, as frustrações, as conquistas, enfim, todas as emoções. Desde o inicio eu sabia que seria um filme intenso, e por este motivo chorei quase que o filme inteiro. O filme mostra um pedaço da vida, nada bonito, uma realidade cruel e cortante, vista e explicada por uma criança. Sem dúvidas um tapa de luva, uma história que deve ser vista. Uma oportunidade de refletirmos sobre o que estamos fazendo de nossas vidas e a maneira que a estamos enxergando-a.