A pacata cidade de Derry, localizada no estado do Maine, poderia facilmente ser classificada como a típica cidade norte americana.
As crianças convivem em um ambiente seguro e livre o suficiente para andar de bicicleta pelas ruas. Os pais são típicos trabalhadores, preocupados com o futuro de seus filhos e dando o máximo para manter a união de sua família. Os adultos, como todo bom adulto, seguem uma vida de responsabilidades enquanto as crianças fazem o que a grande maioria das crianças norte americanas fazem de melhor: os mais velhos perseguem os mais novos, as amizades se fortalecem ao longo do verão, novos amigos são descobertos nos momentos mais inusitados e, às vezes, se o destino permitir, novas aventuras podem contar até mesmo com a presença de monstros assustadores.
Nossa pequena aventura começa durante um dia de chuva, quando as crianças são forçadas a redirecionar suas energias para qualquer tipo de tarefa chata e entediante. Ansioso por encontrar um pouco de distração nas ruas molhadas pela chuva, Georgie, irmão mais novo do atencioso e querido Bill, passa o tempo perseguindo seu barquinho de papel. A perseguição resulta em ótimas gargalhadas até o momento em que o objeto desce pela sarjeta e Georgie se vê frente a frente com uma figura peculiar, um misterioso palhaço que segura seu barquinho e estabelece um diálogo um tanto quanto bizarro com o pequeno garoto.
O tempo passa desde aquela triste tarde chuvosa em que Georgie desaparece como num passe de mágica, deixando para trás as lembranças de sua existência e os brinquedos intocados que nunca mais verão seu dono. A cada dia que passa a pequena cidade de Derry é assolada pelo anuncio de um novo desaparecimento, crianças e mais crianças se afastam para sempre do convívio da comunidade e os adultos parecem não desempenhar seu papel como deveriam, resgatando cada uma das crianças e desvendando os segredos deste mistério insolúvel.
Quando os esforços dos adultos, da polícia, daqueles que deveriam prezar pela segurança de vidas em desenvolvimento não levam a lugar nenhum, é um grupo de “perdedores”, crianças perseguidas por valentões, incompreendidas por serem quem são e manterem sua essência intacta apesar de todos os segredos e dores que carregam consigo, aqueles capazes de enfrentar o que ninguém até o momento foi capaz de enfrentar. Em meio as férias de verão Bill, Richie, Eddie, Stanley, Beverly e Ben, encontraram na amizade a maior força para enfrentar os medos mais profundos que carregam consigo, serão assombrados por Pennywise, um misterioso e assustador palhaço que, parece surgir e ser visto apenas por crianças, além de descobrirem juntos os segredos por trás de tantos desaparecimentos.
It segue uma fórmula própria, podendo pegar desprevenido até mesmo o espectador mais acostumado a filmes de terror. Esqueça os padrões estabelecidos pela franquia Invocação do Mal, esqueça os rótulos que por muito tempo generalizaram o que vinha sendo feito em filmes do tipo. It não tem medo de arriscar por meio de novas estratégias e demonstrar que, para se construir um bom filme de terror, é possível lançar mão de um novo olhar, surpreendendo aqueles que, por muito tempo foram decepcionados pela reutilização das mesmas fórmulas e narrativas.
Aqui encontramos cenas em que a luminosidade é reduzida e a trilha sonora nos prepara para típicos momentos de apreensão, mas, na mesma medida, encontramos exemplos maravilhosos de cenas em que, mesmo com a claridade do dia invadindo o evento apresentado em tela, a apreensão nos invade e faz temer por qualquer que seja o personagem perseguido, torturado, assombrado em cena.
Apesar de se tratar de um filme de terror, o mesmo não ousa apenas na criação de cenas típicas do gênero, lançando mão de estratégias antigas ou novas para desenvolvimento de sua narrativa, garantindo que o espectador fique preso à poltrona, esperando pelo próximo pesadelo apresentado na tela. Ele é verdadeiro ao destacar dramas e traumas enfrentados por crianças da vida real, construindo profundidade para cada personagem que aqui encontramos. Muito mais do que se utilizar de crianças como personagens principais, It acerta ao trazer à tona suas vidas, seus segredos, o fato de serem perseguidos, serem considerados perdedores, possuírem traumas que possivelmente os acompanharão para o resto de suas vidas. Essa estratégia faz com que o espectador se conecte aos personagens e, juntamente a personalidade peculiar de cada um, a força com que vemos a amizade sendo explorada ao longo da narrativa e, os diversos alívios cômicos, a adaptação conquista ao nos apresentar um filme de terror que, mesmo nos pegando desprevenidos, faz com que qualquer amante de filmes de terror se apaixone.
Como se não bastasse a união perfeita entre momentos de apreensão e aquele aperto no peito típico de um ótimo filme de terror, as cenas adoráveis de crianças sendo crianças, fortalecendo sua amizade nos momentos mais simples de diversão e aventuras, It nos encanta com o talento inquestionável do elenco.
Bill Skarsgård encarna Pennywise com todos os seus maneirismos, suas expressões faciais e sua verdadeira imersão do personagem. Se Pennywise já era assustador em nossas mentes, ele se materializa como o vilão que tanto desejávamos e que, com tanta alegria odiamos. Para fechar com chave de ouro, temos o fabuloso elenco mirim que, com suas tiradas engraçadas, suas expressões adoráveis, os momentos de susto e apreensão, fazem com que o espectador esqueça de tudo o que está a seu redor, vindo a concentrar-se apenas na jornada destas crianças maravilhosas, capazes de demonstrar talento nato e, de quebra, estabelecer um novo nível de cobrança para os atores escolhidos para a continuação da adaptação.
It é constante, repleto de momentos preparados com cuidado e habilidade dispostos ao longo da trama, permitindo que o espectador se deixe levar pela história e sinta apreensão pelos desafios enfrentados por este grupo de crianças. Da mesma forma, apresenta muito mais do que meros jumpscares, estabelecendo uma fórmula nova, que pode desagradar aqueles que esperam mais um Invocação do Mal, mas que, com toda a certeza, irá conquistar o bom e velho amante de filmes de terror. It inova, conquista por seus sustos, sua história, seus mistérios e necessidade de respostas. Trata-se de um filme completo, único, cuja continuação irá sofrer para se manter à altura de todo o talento que encontramos no primeiro capítulo dessa história.
It
Lançamento:
2017
Com:
Bill Skarsgård, Jaeden Lieberher, Jeremy Ray Taylor, Sophia Lillis