O papel de presidente americano sempre despertou curiosidade em muitas pessoas e já rendeu muitos filmes, séries e é claro, livros. Esse ano já li dois com essa temática, mas com estilos completamente diferentes e tramas bem distintas também.
Dessa vez quem toma a máquina de escrever é justamente alguém que já sentou na cadeira mais poderosa do mundo, William Jefferson Clinton, mais conhecido como Bill Clinton. E com um ex-presidente, criando uma ficção sobre o cargo que ocupou quase duas décadas atrás, a história ganha diversos pontos de realidade e o leitor fica imaginando – será que Bill passou por algo parecido durante sua administração? – Muitas coisas, sem dúvida nenhuma, são bem mais reais do que ficção nessa história.
O presidente fictício tem inclusive Lincoln em seu sobrenome, mas é mais comum ser chamado de Jon Duncan. Ele vive um momento delicado em sua gestão, está sendo ameaçado de impeachment e não sabe em quem confiar, ele está tentando articular alianças para se manter no poder quando um grupo terrorista chamado Filhos da Jihad ameaça acabar com a internet do país. Dados sumiriam, computadores simplesmente não conseguiriam ler seus softwares, consultas médicas não poderiam ser feitas, aviões não poderiam decolar ou pousar no espaço aéreo americano, sem contar o dinheiro que iria desaparecer das contas dos bancos e a bolsa de valores mais importante do mundo não conseguiria mais operar. Sendo assim, Duncan arranja um aliado inesperado para ajuda-lo, mas que ele não sabe até aonde pode confiar nele e também não sabe se as pessoas que sempre estiveram ao seu lado talvez nunca tenham estado de verdade.
O Dia em que o Presidente Desapareceu é um livro com uma grande carga de atualidade na sua trama, já que traz uma enorme reflexão sobre o quanto mandamos na tecnologia ou o quanto ela manda na gente nos tornando dependentes dela. Um enredo que assusta e não é nada absurdo de se pensar que em breve poderá virar um drama real, vocês estão prontos para voltar a idade das pedras e sequer saber o que é ver a tela de um smartphone?
O livro utiliza uma enorme, e muito bem elaborada, lista de termos utilizados por grandes conhecedores de T.I. e do mundo dos hackers que chega a atrapalhar um pouco o entendimento para os leigos, mas deixa uma incrível dose de realismo ainda maior ao tema. Outro ponto que achei muito interessante na trama é o fato de que, apesar de ainda se utilizar da figura de extremistas do Oriente Médio, desta vez não são os fuzis e metralhadoras as melhores armas deste grupo, os Filhos Da Jihad são exímios hackers e entendedores vorazes de tudo sobre computação, a ponto dos Estados Unidos não terem ninguém no nível dos terroristas cibernéticos para conseguirem se defender.
O livro é quase que cem por cento narrado em primeira pessoa pelo presidente Jon, a não ser em alguns capítulos aonde, em terceira pessoa, são narradas rápidas ações de pessoas misteriosas e que claramente estão contra o governo. Pelo bem do suspense você não fica sabendo quem estas pessoas são ou quem estão defendendo até o grande clímax do enredo.
Desta forma, por ser um livro narrado em primeira pessoa, pelo presidente, o que me incomodou no livro foi a quantidade de vezes que as descobertas feitas pela investigação são recapituladas. A todo momento o presidente conta para alguém novamente toda a história, acho que essas atualizações para terceiras pessoas poderiam sido feitas de outra forma ou apenas suprimida com outros ferramentas na narrativa. Infelizmente ficou muito cansativo, acredito que cerca de 100 páginas das mais de 500 devem ter sido usadas para esses casos.
De qualquer forma, o livro, além de possuir uma trama muito atual, oferece também um suspense magnifico, uma ação diferenciada, já que são poucos os momentos de violência com tiros e mortes, e termina de maneira primorosa. O Dia em que o Presidente Desapareceu é encerrado muito bem, fechando todas as “janelas” que foram abertas, dando um final muito plausível para a situação e impressionante.
Senti poucos traços de James Patterson na trama, o escritor de diversos bestssellers tem se aventurado em programas de TV e desde o ano passado tem sua própria editora. O autor tem uma pegada mais violenta, explora mais mortes e a violência em seus livros, a maneira de escrita e a narrativa em primeira pessoa não são tão presentes em suas obras. Acho que grande parte do livro deve ter sido escrito por Clinton e Patterson apenas organizou a obra e deu algumas dicas na produção, o que não é nada ruim, mostra que Clinton tem uma capacidade imensa de escrever ficção e nos deu uma belíssima trama presidencial, tão explorada em diversos meios, mas poucas vezes feitas por alguém que já esteve naquele local. Desta vez é isso que temos, Bill Clinton, um dos maiores presidentes americanos dos últimos anos escreve uma ficção sobre um presidente americano, ajudado por um dos maiores escritores de thrillers policiais de todos os tempos.
Está não é a primeira vez que Clinton escreve um livro, porém é sua primeira publicação de ficção e teve uma aceitação maravilhosa nos Estados Unidos, chegando a ficar semanas dentre os mais vendidos.
O Dia em que o Presidente Desapareceu tem tudo que uma boa trama de suspense precisa: ação, mortes, mistério, traidores e um enredo muito real, é simplesmente imperdível. Você tem obrigação de ler esse livro.
- The President Is Missing
- Autor: Bill Clinton e James Patterson
- Tradução: Clóvis Marques
- Ano: 2018
- Editora: Record
- Páginas: 504
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