Aperte os cintos e libere a mente de qualquer distração pois teremos aventura, ação, romance, enigmas e um planeta tão árido quanto o deserto texano. Pronto? Então vamos lá! Em uma galáxia distante… Não, não estou falando de Star Wars. Mas já deu para perceber o tom desse livro, certo? Ainda não? Ok, então vou te ajudar.
Imagine nosso pequeno planeta Terra. Imaginou? Agora imagine-o em um futuro distante. Tecnologia avançada, superpopulação, recursos extremamente escassos, a busca por um novo lar no espaço, cidadãos intitulados saqueadores pilhando e fazendo de tudo por uma garrafa de água, corporações multibilionárias ditando as regras de convivência.
Agora, em todo esse cenário de desespero, os cientistas interceptam uma mensagem proveniente do espaço profundo. De uma galáxia distante. A linguagem é compreensível após estudos, mas por trás dela códigos matemáticos escondem uma advertência. Ou assim acredita um cientista, o mesmo que ouviu e decodificou a mensagem. Os seres alienígenas se auto intitulam Eternos e por meio da sua tecnologia, os seres humanos conseguem finalmente explorar o espaço. Mas a ganância tem seu preço e o que deveria ser a nossa salvação, rapidamente se transforma em uma corrida em busca de tecnologias que podem salvar a Terra e, ao mesmo tempo, enriquecer quem estiver disposto a arriscar mais.
Lançado em 2019, O Legado é o volume 1 da duologia Os Eternos de Amie Kaufman e Meagan Spooner publicada pela Editora Morro Branco que, em breve, será adaptado para o cinema pela Columbia Film e pela Cross Creek Pictures, com Doug Liman (Identidade Bourne) na direção, além de Jez e John-Henry Butterworth (007 contra Spectre) roteirizando a adaptação.
A leitura dessa ficção científica jovem adulta me surpreendeu em duas formas: primeiro a rapidez que finalizei esse livro de pouco mais que 300 páginas; e segundo a leveza, diversão e entrosamento presentes no enredo. Para alguém que tinha saído de duas leituras densas e reflexivas, esse livro foi um sopro de alívio no mar tempestuoso que se encontrava minha mente.
A narrativa é atraente e simples para o público jovem, mas também divertida e cheia de influências das grandes obras de sci-fi que o leitor experiente irá reconhecer com facilidade. Temos uma mistura bem proporcionada de: Star Wars onde os eventos acontecem em uma galáxia distante; Indiana Jones emprestando o humor aos personagens como também as aventuras e enigmas a desvendar nos templos perdidos; Mass Effect onde a tecnologia de uma raça alienígena é descoberta pelos humanos ajudando-os a explorar o espaço; ET, porque no final do dia eles só querem ter um lar para onde voltar.
Com esse pacote rico e extremamente versátil, as autoras souberam construir uma história futurista bastante agradável que, além de entreter o leitor irá proporcionar certas reflexões a respeito de “quem somos, porque viemos e para onde iremos”, as três perguntas fundamentais quando se tem alienígenas em qualquer enredo. O tema também irá enaltecer o instinto de sobrevivência que aflora até nos mais pacatos seres humanos e o espírito de companheirismo e lealdade que pode emergir nos mais distintos ambientes.
O planeta é Gaia, cujo acesso se dá por meio de um portal construído com tecnologia alienígena. Um mundo estéril, onde nada além de bactérias microscópicas sobrevive; em seu horizonte, dois sóis emitem uma erupção solar precisa a cada geração, destruindo o mundo inteiro.
A narrativa é centrada em dois personagens, Jules e Amelia, ambos adolescentes e de esferas social, econômica e geográfica completamente distintas. Jules Addison, filho de Elliott Addison, cientista que descobriu e decodificou a mensagem dos Eternos, é o típico acadêmico que tem sede de conhecimento e curiosidade referente à cultura alienígena. Inglês, metódico, extremamente inteligente e, de certa forma, rico, é contratado por uma firma de energia chamada Global para investigar o templo dos Eternos em seu planeta natal. O que o motiva? Provar que seu pai estava certo ao dizer que a tecnologia dos alienígenas traria o apocalipse para a Terra.
Já Amelia Radcliffe, Mia, é uma saqueadora que pretende roubar a tecnologia alienígena e vende-la, no intuito de salvar sua irmã do futuro impiedoso na Terra. Americana, versátil e igualmente inteligente, mas que precisou abandonar a escola por problemas financeiros, é uma sobrevivente que fará de tudo por aqueles que ama.
É quando paramos de olhar para cima que desmoronamos.
Desde as primeiras páginas, o leitor será fisgado para o mundo alienígena em busca de respostas e riquezas assim como os destemidos personagens que souberam driblar a vigilância da AI (Aliança Internacional) sobre o planeta, ou assim eles pensavam. Além de aventuras, romance e enigmas, O Legado apresenta uma trama de manipulação digna de nota que, como um jogo de xadrez, posiciona as peças terráqueas no tabuleiro intergaláctico que é Gaia.
Alguns aspectos da raça e planeta alienígenas chamaram minha atenção mais que outros, como: a configuração dos “templos” e suas armadilhas. O leitor irá achar, de certa forma, familiar as estruturas gigantescas construídas com precisão matemática e estéticas assim como os nossos próprios templos gregos e igrejas góticas. Seja uma coincidência interstelar ou não, deixarei para você julgar melhor na leitura.
Em se tratando de uma ficção científica para jovens adultos, o romance adolescente instantâneo era de se esperar. O que, em alguns momentos, me deixou frustrada por querer mais sci-fi e menos sentimentalismo, mas vejo como essa parte é um atrativo para o público jovem. Afinal, Jules e Amelia são dois lados da mesma moeda, ambos determinados, inteligentes, bons em seus corações e comprometidos com as causas que defendem; era inevitável que se conectassem, especialmente tão longe de casa e de qualquer outro ser humano.
Sem dúvida alguma, O Legado foi uma das minhas leituras mais queridas desse ano. Leve e divertida, viciante e cheia de enigmas, romântica quando tinha que ser, cruel e cheia de maquinações em pontos cruciais. Talvez o leitor se surpreenda tanto quanto eu com o final chocante que, devo confessar, já suspeitava alguns capítulos antes do derradeiro fim o que não deixou de ser intrigante e já me deixar ansiosa pela continuação.
Siga em frente, se ousar.
O livro foi bem construído pelas autoras e satisfez bastante essa leitora que vos fala. Se você gosta de leituras que englobam viagens siderais, raças alienígenas perdidas, mensagens codificadas, armadilhas que devem ser desvendadas corretamente, este livro é para você. E para os fãs dos grandes clássicos de ficção científica, essa é uma boa pedida para descontrair e apreciar os diversos meios de construção literária.
Muito mais que uma narrativa interstelar, Os Eternos irá apresentar o essencial da raça humana: a busca por conhecimento, a atração pelo desconhecido, a lealdade para o outro, a aventura de tirar o fôlego e o romance juvenil que todos nós experimentamos ao menos uma vez na vida. E, o mais importante de tudo, o quanto podemos aprender com os erros do passado ao analisarmos para corrigir no futuro.
Desafio a você explorar o máximo dessa experiência de leitura. Recomendo ouvir a trilha sonora do filme Interestelar, facilmente localizada no Spotify, quando iniciar esse processo de leitura. Boa exploração viajante!
- Unearthed
- Autor: Amie Kaufman e Megan Spooner
- Tradução: Sofia Soter
- Ano: 2019
- Editora: Morro Branco
- Páginas: 352
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