Tudo começa com uma foto misteriosa, um grupo de cinco amigos, uma tragédia e um show de rock. Aparentemente sem conexão entre eles, esses eventos se mostram mergulhados em uma turva nuvem de lembranças duvidosas, traumas marcantes e passados desconhecidos. Quem eram aqueles jovens e como aquela foto foi parar nas mãos de Grace Lawson, pintora nova-iorquina que buscou no subúrbio o almejado refúgio para sua família? E como a confissão de um serial killer condenado, um advogado, um incêndio fatal, uma dona de casa viciada em romances investigativos, um mercenário coreano e um marido desaparecido se encaixam na trama?
Esse suspense policial, inédito no Brasil, do americano Harlan Coben, tem todos os requisitos para se tornar o seu novo livro favorito. Prepare seus ouvidos caro leitor, ao ler este quase calhamaço o som distante de uma banda de rock dos anos 80 certamente invadirá seu cérebro ao passo que a adrenalina e a sede por desvendar o mistério não lhe deixará largar estas páginas até o seu derradeiro fim.
Enviado pela TAG Inéditos em julho no aniversário de 5 anos do clube, este thriller foi o meu primeiro contato com a escrita de Coben, apesar de já ter um exemplar dele intocado em minha biblioteca, e não imagino como poderia ter sido melhor. Muitas vezes, ao adquirir um livro com uma temática já familiar e interessante, sinto minhas expectativas alcançarem patamares bastante elevados e algumas vezes acabo não apreciando a leitura como gostaria. O que, definitivamente, não aconteceu desta vez visto que devorei as pouco mais de 400 páginas em menos de 24 horas. Um recorde que há tempos não reprisava.
A escrita do autor é extremamente envolvente, insinuando suas garras no leitor e chamando sua atenção à tecer teorias desde o primeiro capítulo até a composição de uma verdadeira rede de hipóteses que cairá por terra ao final da leitura com a trama sendo desnuda lentamente. A cada novo capítulo uma reviravolta e acontecimentos mais eletrizantes que os anteriores, sem dúvida uma boa gama de referências será captada pelo leitor mais experiente nesse estilo literário; de episódios da série televisiva CSI à outros escritores de suspense investigativos, como Dan Brown, Agatha Christie, Jo Nesbo, Conan Doyle, Ana Teresa Pereira, dentre outros.
Sem mais delongas, o leitor será apresentado a Grace que, à primeira vista, é uma típica dona de casa do subúrbio. Leva os filhos na escola e em suas atividades extracurriculares, faz compras, limpa e mantém sua casa, é devota e apaixonada por seu marido… Mas, além disso, descobrimos que ela é uma excelente pintora de considerável fama e que, em um passado remoto, sofreu um acidente bastante traumatizante que, para piorar, foi divulgado durante meses na mídia, o fato dela ter sido uma das sobreviventes. Fugindo para o exterior em busca de anonimato e sem ter lembranças do ocorrido, conhece Jack, também cheio de segredos, e os dois logo se apaixonam, constituindo uma família ao voltar para os Estados Unidos no intuito de criar os filhos na terra de seus pais.
Tudo parece ir de vento em polpa na vida de Grace, Jack, Emma e Max, até o dia em que Grace busca um molho de fotos reveladas à moda antiga e descobre que uma delas destoa do restante: é desbotada, o papel é diferente, onde posam cinco jovens – dois homens e três mulheres, uma delas com um X marcado no rosto – os quais ela desconhece, mas ao olhar com mais atenção vê que um dos homens parece e muito com seu marido. A trama se intensifica quando este, ao ver a foto em cima do balcão da cozinha, enlouquece exigindo uma explicação de onde ela havia conseguido aquela fotografia. No instante seguinte, após discutirem e ele receber um telefonema, Jack sai de casa e não volta mais deixando Grace à mercê de pensamentos e sentimentos conflitantes.
Existem rupturas súbitas. Rasgos na vida, profundos ferimentos a faca que retalham a carne. A existência é uma coisa e, depois de estraçalhada, vira outra. Desmorona como vísceras que caem por um corte no abdômen. E ainda há aqueles momentos em que ela simplesmente se desmancha. Um fio solto é puxado. Uma costura cede. A mudança é lenta a princípio, quase imperceptível.
A partir desse ponto, todo “o inferno corre solto” e conhecemos a verdadeira força, persistência, inteligência e sagacidade do caráter feminino aí descrito tanto na personagem principal Grace quanto nas secundárias Charlaine e Cora. Em uma luta constante em busca da verdade, de seu marido e de sobrevivência, vemos o potencial escondido dentro de todos nós ser liberado quando em tempos desesperadores.
Não vou me estender longamente a respeito dos personagens secundários, vocês notarão que, durante a leitura deste livro que eu recomendo muitíssimo, cada um deles foi extremamente bem construído, de uma maneira tão primorosa que eu realmente me senti inserida em uma investigação criminal em andamento com romance, mistério e ação dispostos belamente ao longo do suspense. Senti o desespero, a ânsia por respostas, o medo e a torcida para um final onde nenhuma ponta ficasse solta.
Meus caros leitores, não é a toa que Harlan Coben é o único escritor a ter recebido a trinca de ases – o Anthony, o Shamus e o Edgar Allan Poe – da literatura policial americana pois, esse pequeno tomo tem um início cheio de perguntas, mistérios, dúvidas, traições e mortes que seguiram até o final com um pequeno diferencial que para outros poderia não ser possível: todos os eventos descritos estavam intrinsecamente conectados e todos tiveram suas respostas no final, sem exceções.
Sem dúvida alguma, imagino o montante resultante da pesquisa que o autor realizou para escrever seus livros. A cada nova página, a cada novo personagem apresentado em mais um dilema, a vingança se sobrepondo inicialmente a todos os sentimentos humanos e causando tantos conflitos e desastres. Os momentos em que o meu queixo caiu por descobrir o que aconteceu com um dos personagens chave e a cadeia de eventos que levou aqueles cinco jovens – partindo de um show de rock, de uma música – a experimentarem tanta dor. Mas, um dos pontos mais cruciais que o autor retrata ao finalizar este livro é que todo o processo dolorido, de mentiras, mortes e violência, forneceu um amadurecimento e paz de espírito nos personagens que descobriram quem realmente eram e o que de verdade havia acontecido em suas vidas.
Finalizo ressaltando a edição de Apenas Um Olhar, assim como todas as edições da TAG Livros, esta não poderia ser diferente; o capricho na arte gráfica, o conforto na hora da leitura decorrente à qualidade da diagramação, o jogo de cores que envolve o leitor no mistério que encontrará em suas páginas. Sem dúvida, um dos melhores projetos do clube e, muito certamente, meu livro favorito desse ano. Tenho certeza que você, amante do suspense, do romance policial, do jogo de gato e rato narrado em tantas histórias seriais, e, por último, do bom e velho Rock n’ Roll de vanguarda irá apreciar, degustar e devorar esse livro como um homem no deserto ao ver uma fonte de água pura. Boa leitura e boa sorte desvendando esse mistério envolto em fatos verídicos.
- Just One Look
- Autor: Harlan Coben
- Tradução: Ricardo Quintana
- Ano: 2019
- Editora: Arqueiro EM PARCERIA COM A TAG INÉDITOS
- Páginas: 432