Os Panteras Negras revolucionaram os Estados Unidos e o mundo, criados durante a segunda metade dos anos 60, foram símbolos ativos da luta racial, e dentre os principais nomes do partido estava Fred Hampton, presidente do partido no estado de Illinois, e será a sua batalha em Chicago, sua luta para angariar mais companheiros e principalmente a forma escolhida por ele para difundir suas ideias, que será contada em Judas e O Messias Negro.

O filme é dirigido, produzido e roteirizado por Shaka King, um americano de apenas 40 anos, especializado em curta metragens que chega neste ano, com seu segundo longa, a uma indicação ao Oscar.

Judas e O Messias Negro é pesado, a história é dura. Um dos companheiros de Fred é coagido pelo FBI a entregar seus amigos, ele precisa gravá-los, mostrar o que estão planejando em troca da sua liberdade, e, possivelmente, da sua vida. Um negro traindo seu Messias e seus amigos. O longa conta com muita ação, passagens duras, de muito sangue, brigas, tiros e a forma como tudo isso é colocado em cena, as vezes, assusta, seja pela crueldade ou pelos jumpscares preparados pelo diretor, o que, aliado com uma belíssima fotografia, deixa evidente a preocupação que Shaka King teve com a construção da narrativa, que é muito bem planejada e executada. Pequenos detalhes nas cenas, como objetos de cozinha colocados exatamente no lugar onde a câmera os filma são a prova de que cada detalhe foi friamente calculado, mostrando o quão merecida é a sua indicação ao prêmio de Melhor Fotografia.

Outro ponto que me fez amar o estilo de filmagem foi a maneira como o diretor coloca pessoas conversando, em vários ambientes, com a câmera filmando quem fala, mas posicionado no ponto de vista que quem está escutando, fazendo uma troca de locutor de maneira fluída e muito natural. A técnica coloca o telespectador dentro da cena, algo simplesmente fabuloso, além de original e surpreendentemente necessário, já que o filme é um enorme trabalho de debate sobre as ideias da luta contra o racismo, mostrando o passado de elementos importantes do governo e da segurança americana e como as coisas sempre foram duras para quem encara essa batalha.

Não é só a fotografia do filme que é perfeita, o trabalho de som dele é muito cuidadoso, desde portas batendo, gritos ou o estrondo de um tiro que acaba com o silêncio de uma cena,  dando o tempo necessário para o cérebro dos espectadores digerir aquela informação. Mas o ponto principal está ligado ao fato de fazer todo o bom cinéfilo se sentir parte do filme, das discussões, dos discursos. Este trabalho certamente lhe renderia o prêmio de Melhor Som, que ficou com Ford vs Ferrari em 2020.

Quanto a categoria de Melhor Roteiro Original, acredito que o filme é um dos favoritos, o roteiro é muito bem montado, sem pular partes e contando a história completa com começo meio e fim, que não deixa dúvidas e termina na hora exata, da melhor forma possível para a narrativa, não vi defeitos para que o prêmio seja de outro indicado.

Daniel Kaluuya, indicado a Melhor Ator Coadjuvante, está fenomenal interpretando o memorável Fred Hampton, ele da o ímpeto necessário aos discursos inflamados, passa a emoção de maneira precisa e demonstra crescimento nisso, desde o começo do filme, quando Fred ainda era inexperiente e mal sabia influenciar novos companheiros, para um final maravilhoso, digno de deixar o grande Martin Luther King orgulhoso de quem seguiu propagando suas palavras. Ao seu lado também concorre, Lakeith Stanfield, que interpreta Bill O’Neill, porém este segundo, com uma atuação muito mais fraca. Kaluuya deve receber sua estatueta, é o favorito e ganhou todos os prêmios da categoria pelo filme. Ele é um ator experiente e essa é sua segunda indicação ao Oscar, a primeira foi em 2018 por Corra!, naquela ocasião como Melhor Ator.

Confira a crítica de Corra!

Porém, quem pra mim melhor atua no filme, é justamente a companheira de cena de Daniel, Dominique Fishback, que interpreta Déborah Johnson, parceira e mãe do filho de Fred. Ela está incrível, a sua interpretação muda, suas expressões e como ela dialoga sem usar nenhuma palavra é fenomenal. A atriz chegou a ser indicada como Melhor Atriz Coadjuvante no prêmio da BAFTA, porém não levou e não recebeu a indicação ao Oscar, uma imensa injustiça. 

Judas e O Messias Negro é um bom filme, ser agraciado como o melhor do ano quando George Floyd enfim recebe justiça, da mesma forma que policiais mataram muitos Panteras Negras seria um símbolo gigantesco, iria proporcionar um discurso fabuloso e tornaria o filme inesquecível. Mas será que Hollywood está preparada para dar um Oscar de Melhor Filme para uma película que briga tanto com o passado racista do governo do seu país? Será que eles estão prontos para deixar o preconceito que existe na própria indústria cinematográfica?

Minhas apostas são que Judas ficará com os prêmios de Melhor Roteiro Original, dou como certa a vitória em Melhor Filmagem e Daniel Kaluuya levará o de Melhor Ator Coadjuvante. Fico também na torcida para Fight For You (H.E.R), em Melhor Canção Original, mas sem a menor dúvida eu vibraria muito vendo está obra maravilhosa ser coroado como Melhor Filme, uma resposta para as palavras de Fred Hampton, que fizeram a diferença, que muita coisa mudou desde então, já que os seus assassinos levaram mais de uma década para receberem sua sentença.

RESENHA ESCRITA EM PARCERIA COM JOICE CARDOSO

  • Judas and The Black Messiah
  • Lançamento: 2020
  • Com: Daniel Kaluuya, Lakeith Stanfield, Jesse Plemons
  • Gênero: Biografia, Drama
  • Direção: Shaka King

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