Em época de pandemia os livros podem ser os melhores meios de viajar em segurança, e desta vez começaremos nosso passeio em Brighton, cidade litorânea britânica que fica a quase 100 km da capital Londres, local onde Hal Westaway trabalha lendo a sorte das pessoas através das cartas de tarô. Pelo menos era isso que os clientes que ela conseguia imaginavam, mas na verdade Hal era uma grande trapaceira, tinha o dom de capturar de suas vítimas informações durante uma consulta que faziam parecer que ela estava adivinhando algo, impressionando a pessoa enganada.
Mas ela nunca foi tão boa em fazer isso, afinal, se fosse não estaria sofrendo em uma verdadeira pindaíba, sem dinheiro nem para pagar seu aluguel. Sofrendo com a pressão do agiota, ela se vê sem saída, sem a menor condição de prever seus próximos passos, sua vontade era fugir, sair da sua vida, se tornar outra pessoa, e então chega uma carta.
A carta endereçada está avisando que sua avó morrera e ela herdará uma imensa quantia em dinheiro e algumas propriedades, para isso ela precisará viajar para a Cornualha, local de praias paradisíacas, quase ao extremo sul da Inglaterra, Hal receberá o dinheiro que precisa, passará um tempo longe de casa e longe do cara que está prometendo arrancar seu pescoço. Parece que os céus estão lhe mandando uma nova chance de vida.
Só há um problema, ela não é a pessoa que deveria receber a correspondência, suas avós, tanto a materna como a paterna, morreram há décadas, toda essa herança não é para ela, porém, para quem precisa mudar de identidade isso parece um sonho, não um pesadelo.
Gosto demais dos livros da Ruth Ware, desde A Mulher na Cabine 10, passando por O Jogo da Mentira, ver na escrita os detalhes que ela provavelmente aprendeu lendo Agatha Christie e Sir Arthur Conan Doyle e a maneira como ela sabe colocar os elementos de suspense em sua obra é realmente muito interessante e prazeroso, mas infelizmente seu novo livro me decepcionou um pouco.
Digo que decepcionou por dois fatores, o primeiro é que eu vinha de experiências muito boas com ela, as leituras estavam sendo maravilhosas, com mistérios instigantes e um crescimento literário entre um livro e outro muito evidente. O segundo fator era a sinopse deste livro em especifico que é muito interessante, a ideia de termos uma protagonista trapaceira, com uma oportunidade de melhorar de vida é incrível, aliás, adoro protagonistas que não são boazinhas, que muitas vezes, inclusive, você não sabe sequer se ela não é a criminosa da história.
Mas, nenhuma das minhas expectativas foram atingida. Hal desce o Canal da Mancha, em direção à Cornualha, que a propósito é um dos lugares que a literatura mais me deixou com vontade de conhecer na vida real, seja pelo famosíssimo “O Mistério da Cornualha”, do maravilhoso Detetive Hercule Poirot, passando pelo não tão maravilhoso “A Criança de Fogo”, que apesar de não ser um bom livro dá uma ideia fabulosa do ambiente britânico. Ela vai em busca da sua herança, que não é sua, e de uma nova vida. Chegando lá encontra uma família em pedaços, brigas, intrigas, e muito interesse pelo dinheiro, tudo isso deve ter ajudado na morte da vovó Westway.
O livro se torna muito mais uma discussão entre família do que propriamente um mistério ou suspense regado a muita morte e ação, como eu realmente gosto. A Morte da Sra. Westway tinha tudo para ser um thriller, mesmo que psicológico, muito interessante, mas fica mais pra um livro de resolução de problemas familiares, onde o mistério e os segredos de Hal poderiam ditar o ritmo da história, mas não consegue fazer isso.
Uma das coisas que mais me incomodou foi a quantidade de personagens, além de alguns serem bem incoerentes com sua posição, ou forçados, mostrando personalidades que dificilmente seriam aceitas por quem convivesse com eles.
Quanto ao mistério, ele não foi previsível, mas deixa a desejar no fato de ter uma resolução crível e aceitável, muito diferente daquilo que as outras obras da escritora nos apresentaram. Ruth Ware tem uma qualidade fabulosa na sua escrita, lembra muito sua grande mestra Agatha Christie, com suspenses leves e mistérios instigantes. Sem recorrer a muito sangue, consegue entregar uma leitura que serve muito bem como um entretenimento leve e que poderia ser lido por qualquer tipo de leitor, mas desta vez acaba fazendo um livro aquém do seu potencial, não se sai tão bem, e acho que faz o roteiro, que poderia ser muito bom, ser atrapalhado, comum e raso, infelizmente.
- The Death of Mrs. Westaway
- Autor: Ruth Ware
- Tradução: Alyda Sauer
- Ano: 2021
- Editora: Rocco
- Páginas: 320
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