História sempre foi minha matéria favorita na escola e, até o presente momento, flerto a possibilidade de uma futura graduação na área. Então, quando me deparei com este enigmático título da provável existência de um viking de pele negra, tendo sido um dos maiores heróis nórdicos, fiquei intrigada e curiosa o bastante para mergulhar em sua leitura. Contudo, já lhes deixo um aviso repassado pelo próprio autor – embora o mesmo tenha usado outras palavras – de que esta obra não é de todo 100% fidedigna, mas sim um compêndio formado por anos de pesquisa onde relatos de testemunhas nem sempre confiáveis, fatos históricos incompletos e grande parte do imaginário do próprio escritor que é descendente em trigésimo grau do dito “viking negro”.

Por que lhes falo entre aspas? Veja bem, ele era visto como negro para as pessoas da época, mas não para os padrões atuais. Em minhas próprias pesquisas, ainda no início da minha leitura de O Viking Negro, me deparei com um artigo traduzido da historiadora Maria Kvilhaug confirmando que, sim, Geirmund (Heljarskinn) Pele-Negra, que viveu entre 850 e 950 dC, possuía a pele mais escura que a de seus conterrâneos vikings, contudo, ele não era afrodescendente visto que sua mãe era siberiana, descendida dos mongóis que possuíam cabelos negros e pele escura, e seu pai um autêntico homem nórdico – branco de cabelos claros.

Tendo seus pais de tons de pele distintas se casado e gerado dois meninos, a pigmentação mais escura se sobressai e, nesse caso, Geirmund e seu irmão Hamund ficaram com a aparência da mãe; quando naquela época o esperado era que a prole se assemelhasse com a linhagem paterna. Este fato nós hoje conhecemos devido aos estudos de biologia e genética.

Rei Hjor, sua rainha siberiana Ljufvina e os gêmeos Geirmund e Hamand

Com esse esclarecimento segui com a leitura que, a não ser que você possua certo conhecimento da língua nórdica, foi bastante arrastada devido a quantidade exorbitante de nomes na língua materna do escritor até simplesmente desistir de tentar lê-los e simplesmente substituir, mentalmente, tais palavras por “fulano de tal” para nomes de pessoas muito complexos ou “naquele lugarejo” para localidades igualmente complexas. Mais um obstáculo vencido e, finalmente a leitura andou!

Birgisson nos conta, de maneira muito bem escrita, pesquisada e floreada, a origem de Geirmund que é de fato extremamente interessante. Tendo os dois nascidos de pele e cabelos escuros e todos se surpreendido – negativamente, pelo motivo que já mencionei anteriormente – com a aparência dos gêmeos, envergonhada, sua mãe, Ljufvina decide então trocar seus filhos com o recém-nascido de sua escrava branca na tentativa de que assim fosse favorável ao rei Hjör.

Nossos conceitos modernos nos fariam ler esta passagem como preconceito e racismo, o que não era o caso para a época, mas sim, como já mencionei anteriormente, era se esperado que a prole fosse semelhante à aparência do pai e não da mãe. Curioso foi o fato de que o garoto branco, filha da escrava, cresceu fraco, constantemente doente e sem qualquer instinto desbravador; ao contrário dos gêmeos negros que se desenvolviam brilhantemente a cada dia. Mais cedo do que tarde, o rei Hjör descobre o feito da mulher e resolve então recolocar seus filhos em seu lugar de direito.

O autor discorre acerca de seu processo de pesquisa e de como complementou algumas das lacunas que o tempo e a falta de registros escritos deixaram na jornada por seu ancestral viking. Um dos primeiros a se estabelecer na Islândia, sendo também um dos mais ricos, tendo nascido em Rogaland (Noruega), Geirmund foi simplesmente uma peça essencial para a expansão do povo nórdico, inclusive o comércio e exploração marítima.

É fascinante pensar que Geirmund falava o belo e rústico idioma conhecido pelo nome de nórdico antigo. Os sons dessa língua sugerem o retinir do aço ou o baque de um machado ao partir uma acha de lenha – curto e direto ao ponto.

Trazendo árvores genealógicas e relatos dessas explorações, Birgisson elucida o leitor de quem realmente foi seu ancestral e como ele foi importante para os dias atuais da Islândia. A grande quantidade de notas me ajudou bastante a passar por esta biografia com ares de romance histórico, melhorando minha experiência que, sem elas, teria sido ainda mais truncada.

Sem dúvida um bom livro para conhecer a fundo a história de um dos maiores heróis nórdicos, apesar da ideia passada inicialmente referente a persona de Geirmund ter sido distorcida por motivos desconhecidos – e um dicionário da língua cairia bem para os leitores leigos na mesma. Se você que gosta de aventuras, vikings e eras antigas e que deseja desvendar os reais acontecimentos, aqueles que raramente se tem conhecimento, mas que valem a pena ser desbravados, esta leitura está te chamando!

  • Den Svarte Vikingen
  • Autor: Bergsveinn Birgisson
  • Tradução: Guilherme da Silva Braga
  • Ano: 2021
  • Editora: Globo Livros
  • Páginas: 336
  • Amazon

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